Uma ilha alemã
13 April 2017
Depois de quase quinze anos na Alemanha eu decidi que queria conhecer outro pedaço do país. O norte, as ilhas, as praias da Alemanha. Só de se falar já soa um pouco esquisito: Alemanha e praia não combinam. O que se associa com a Alemanha então? Quando você pensa em Alemanha você pensa em frio, em neve, em inverno, torta de maçã, pão preto, salsichão. Quando você pensa em praia você pensa no Brasil, Caribe, cervejinha na mão, sambão… Agora Alemanha e praia, não.
Bom, esse já foi o primeiro desafio ao escolher o destino. O segundo é você ouvir o que um alemão espera de uma praia: caminhadas ao vento bem empacotado numa blusa de frio grossa, cachecol e um óculos de areia. Note—se que a cadeira de praia alemã não é para tomar banho de sol! Não! É para se proteger do vento, enquanto você lê seu livro preferido empacotado no seu capote de lã e no seu óculos de areia: caso você nunca tenha visto uma cadeira de praia alemã, procure no google "Strandkorb".
Brasileiro deita na areia pra tomar uma corzinha e geralmente sai bronzeado do sol. Quando alemão toma uma corzinha na praia, ele fica ou azul ou roxo do frio: vejam as crianças saindo da água com 15 graus (felizes!! diga—se de passagem). Ou ver as mãos azuis das crianças fazendo castelo de areia na praia com o vento soprando.
Um brasileiro que visita uma praia alemã só balança a cabeça em uma mistura de transtorno e confusão.
Acho que isso em si já demonstra que os alemães se diferenciam essencialmente dos brasileiros. A ideia da praia ideal de um alemão é uma praia larga e deserta. Ninguém para a direita, ninguém para a esquerda. Acho que o alemão tem prazer em ser pioneiro. Um dia bom de praia para um Brasileiro é um dia em que a praia esteja lotada, solzão, petiscos no quiosque. Enquanto o brasileiro gosta da família inteira na praia reunida, todo mundo falando junto, trocando "malmita". Aqui no norte da Alemanha o povo vem pra praia pra ler um livro ao vento, sozinho, sem ninguém pra perturbar, só a esposa, talvez… talvez…
Bom, acho que depois de todas essas descrições, eu tenho que justificar o porquê de tirar ferias numa ilha alemã. Ilha alemã… outra associação que não combina: ilha paradisíaca, ok, ilha grega, ok — ilha alemã?Não! Mas tudo bem. O que me convenceu a vir para uma ilha alemã foi a curiosidade combinada com a ideia de uma semanas longe da cidade grande.
Spiekeroog (esse é o nome da ilha) tem 750 habitantes e é uma mistura de Alemanha, Holanda e Dinamarca. As casas parecem holandesas, o estilo dinamarquês, a língua é o alemão. Eu me surpreendi com várias coisas: minha habilidade de me ocupar com outras coisas que não sejam meu celular, por não ter cometido um homicídio depois de mais de 3 dias nessa cidade sem TV nem internet. Me surpreendi com a gastronomia da ilha, que é excelente: cafés que não só tem o estilo escandinavo, mas também bolos e chás fantásticos. Restaurantes com chefes excelentes cozinhando peixe e camarão frescos. Me surpreendi em conseguir montar uma rotina boa: acordar cedo, correr na ilha, cheia de neblina e não encontrar nenhuma alma viva. Voltar tomar um banho quente, tomar café, caminhar na praia, almoçar, assistir um filme, escrever um texto, planejar os próximos dias e sair pra jantar num lugar legal. É… férias na roça não precisam ser chatas. Muito pelo contrário, correr numa barragem (dike) ao nascer do sol, com neblina não tem preço. Taí, acabei até gostando...